A virtude teologal da esperança se fortalece quando há derrota e dificuldades
Nesta série de artigos sobre as Virtudes Teologais, vimos como a fé cresce e se fortalece gerando a esperança. Vencidos os pecados que podem acabar com essa virtude, veremos, agora, como crescer nesta virtude teologal.
Embora a esperança humana, confundida com otimismo, esteja baseada em conjecturas e pensamentos “positivos”, essa virtude teologal está fixada e direcionada para Deus. Ela não se baseia na crença em capacidades ou qualidades humanas, em anos de estudo, trabalho ou especialização, mas, unicamente, numa firme convicção e confiança em Deus.
Afinal, Aquele que sabe de cor a quantia dos fios dos cabelos de seus filhos, Aquele que diz para confiar que tudo proverá (Mt 6,34), Aquele que é verdadeiro e fiel, é a verdadeira esperança. Diferentemente do vício da presunção, que estudamos no artigo anterior, a confiança em Deus sabe que nada merece. Melhor ainda, percebe que seu verdadeiro merecimento, por intermédio da justiça, seria a punição por ser tão frágil e relapsa, mas espera na misericórdia e confia que ela virá.
Santa Teresinha do Menino Jesus relatava uma confiança absurda, fruto de uma virtude da esperança sem igual: conseguia alegrar-se com seus erros e defeitos, pois entendia e esperava que a misericórdia de Deus deveria se derramar ainda mais sobre ela. Essa esperança, verdadeira virtude, consegue compreender que quando se é fraco perante Deus, verdadeiramente Ele vem em socorro e fortalece aqueles que O amam (2Cor 12,10).
Diferentemente da esperança-otimismo humano, que só existe quando tudo se encaminha bem, a virtude teologal da esperança se fortalece quando há derrota e dificuldades. Essa é a prova da verdadeira virtude da esperança! Embora o mundo todo sofresse com a aparente derrota do Messias na cruz, a Virgem esperava. Diante de tudo que possa dar errado, o Salmo repete “fortifique-se o teu coração e espera no Senhor!” (Sl 26).
Terapia da esperança
Papa Francisco, em suas recentes catequeses sobre as virtudes teologais, propõe uma terapia da esperança. Pede para que se esteja atento, pois, no fracasso, na derrota, Deus mesmo se aproxima para nos escutar como fez com os discípulos a caminho de Emaús. Deve-se colocar os medos e fracassos nas mãos d’Ele, e perceber que, através dos exemplos das Escrituras, Deus constrói a esperança.
Este é um traço fundamental de quem tem uma esperança viva: o conhecimento da Palavra de Deus. Somente por meio do estudo e da compreensão da ação de Deus na história pode-se perceber sua atuação e crescer em esperança. São João da Cruz insiste que a virtude da espera está ligada à faculdade da memória. Realmente, somente ao se trazer, pela memória, a ação de Deus onde havia aparente derrota, pode-se compreender e esperar a ação do Senhor. Aquele que preenche sua memória com a Palavra de Deus tem combustível suficiente para esperar no momento em que todos desistem.
São inúmeras as referências bíblicas à espera e à memória das ações de Deus, que sustentam a esperança. Para citar apenas dois: “Ó Jacó, recorda-te, pois, destes fatos; sim, ó Israel, lembra-te tu destes acontecimentos” (Is 44,21) e “Espero no Senhor, minha alma espera na tua palavra. Minha alma aguarda o Senhor mais que as sentinelas a aurora” (Sl 130,5-6).
Confiar em Deus
A visão do mundo através dos olhos da fé possibilita o surgimento da esperança. Assim, o deserto e o desterro tornam-se lugar de encontro (Os 2,14 e Gn 39,1); a morte não vem para a aniquilação, mas para a realização do plano de Deus (Jo 11,4), e o Egito não é mais lugar da opressão, mas se torna lugar de proteção (Mt 2,13). Esse novo olhar, fruto da fé e sustentado pela esperança, provoca um desprender-se do mundo e de sua lógica material. Aquele que faz crescer a virtude da esperança em si, obrigatoriamente, desenvolve uma nova atitude perante a vida e os acontecimentos.
Como a consequência natural do desenvolvimento da vida de fé é o crescimento da virtude da esperança, esta traz, à medida que se estabelece, a verdadeira caridade. Este amor a Deus e a todos, por serem vistos através do amor a Deus, só pode se desenvolver a partir deste desprender-se do mundo e da confiança absoluta no Senhor.
No próximo artigo, começaremos a entender melhor a maior de todas as virtudes e o dom por excelência: a virtude da caridade.
Radio Vaticano