O valor fundamental que devemos reconhecer e promover é o da dignidade da pessoa humana. Convido-vos, portanto, em vossas deliberações, a fazer da dignidade intrínseca de cada homem e de cada mulher o critério-chave na avaliação das tecnologias emergentes, que revelam sua positividade ética na medida em que ajudam a manifestar essa dignidade e aumentam sua expressão, em todos os níveis da vida humana.
Foi o que disse o Papa ao receber em audiência na manhã desta segunda-feira, 27 de março, na Sala do Consistório, no Vaticano, os participantes dos Minerva Dialogues, promovidos pelo Dicastério para a Cultura e a Educação.
Ao dar as boas-vindas aos participantes dos Minerva Dialogues, um grupo de cerca de 30 pessoas, reunidos em Roma para seu encontro anual, Francisco ressaltou que este convoca especialistas do mundo da tecnologia – cientistas, engenheiros, empresários, juristas e filósofos – juntamente com representantes da Igreja – oficiais de Cúria, teólogos e moralistas -, com o objetivo de promover uma maior consciência e consideração do impacto social e cultural das tecnologias digitais, em particular da inteligência artificial.
Estou convencido de que o diálogo entre crentes e não crentes sobre as questões fundamentais da ética, ciência e da arte, e sobre a busca do sentido da vida, é um caminho para a construção da paz e do desenvolvimento humano integral. A tecnologia é de grande ajuda para a humanidade. Pensemos nos inúmeros avanços nos campos da medicina, engenharia e comunicações. E enquanto reconhecemos os benefícios da ciência e da tecnologia, vemos neles uma prova da criatividade do ser humano e da nobreza de sua vocação para participar responsavelmente da ação criativa de Deus.
Nesta perspectiva, continuou o Santo Padre, considero que o desenvolvimento da inteligência artificial e da aprendizagem da máquina tem o potencial de dar uma contribuição benéfica para o futuro da humanidade. Estou certo, entretanto, de que este potencial só será realizado se houver uma vontade coerente por parte daqueles que desenvolvem as tecnologias para agir de forma ética e responsável. Conforta, nesse sentido, prosseguiu o Pontífice, o compromisso de tantos que trabalham nestes campos para garantir que a tecnologia seja centrada no homem, fundamentada em bases éticas na progetação e orientada para o bem.
Francisco disse saudar os esforços das organizações internacionais para regular essas tecnologias de modo que elas promovam um progresso genuíno, ou seja, contribuam para deixar um mundo melhor e uma qualidade de vida integralmente superior.
O imenso crescimento tecnológico não foi acompanhado por um desenvolvimento do ser humano em termos de responsabilidade, valores e consciência”, observou Francisco. Além disso, “o mundo de hoje é caracterizado por uma grande pluralidade de sistemas políticos, culturas, tradições, concepções filosóficas e éticas e crenças religiosas. As discussões são cada vez mais polarizadas e, na ausência de confiança e de uma visão compartilhada do que torna a vida digna, os debates públicos correm o risco de ser polêmicos e inconclusivos”.
Preocupa-me o fato que os dados até agora levantados pareçam sugerir que as tecnologias digitais têm servido para aumentar as desigualdades no mundo. Não apenas diferenças na riqueza material, que são importantes, mas também diferenças no acesso à influência política e social. Perguntamos: nossas instituições nacionais e internacionais são capazes de responsabilizar as empresas de tecnologia pelo impacto social e cultural de seus produtos? Existe o risco de que a crescente desigualdade possa minar nosso senso de solidariedade humana e social? Poderíamos perder nosso senso de destino compartilhado? Na realidade, nosso objetivo é que o crescimento da inovação científica e tecnológica seja acompanhado por uma maior igualdade e inclusão social.
Francisco continuou sua abordagem ressaltando que este problema da desigualdade pode ser agravado por uma falsa concepção de meritocracia que mina a noção de dignidade humana. O reconhecimento e a recompensa do mérito e do esforço humanos têm uma base, mas existe o risco de conceber a vantagem econômica de uns poucos como conquistada ou merecida, enquanto a pobreza de muitos é vista, em certo sentido, como culpa deles. Esta abordagem subestima as desigualdades iniciais entre as pessoas em termos de riqueza, oportunidades educacionais e laços sociais, e trata o privilégio e a vantagem como conquistas pessoais. Consequentemente – em termos esquemáticos – se a pobreza é culpa dos pobres, os ricos estão isentos de fazer algo a respeito.
Francisco concluiu reafirmando a convicção de que somente formas verdadeiramente inclusivas de diálogo podem permitir discernir sabiamente como colocar a inteligência artificial e as tecnologias digitais a serviço da família humana.
Mariangela Jaguraba – Vatican News
O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira (27/03), na Sala do Consistório, no Vaticano, os bispos, superiores, formadores e seminaristas da Calábria por ocasião de sua peregrinação a Roma.
Depois de saudar todos os presentes, o Papa se deteve na pergunta que Jesus faz aos discípulos: «O que vocês estão procurando?» “Às vezes procuramos uma “receita” fácil, mas Jesus começa com uma pergunta que nos convida a olhar para dentro, para verificar as razões do nosso caminho”, disse o Pontífice. “A vocação de vocês é caminhar com o Senhor, o amor do Senhor. Tomem cuidado para não caírem no carreirismo que é uma praga, o carreirismo é uma das formas mais feias de mundanismo que nós clérigos podemos ter”, sublinhou.
A seguir, o Papa perguntou aos seminaristas: «O que vocês estão procurando? Qual é o desejo que os levou a sair ao encontro do Senhor e a segui-lo no caminho do sacerdócio? O que vocês procuram no Seminário? E o que procuram no sacerdócio? “Devemos nos perguntar, porque às vezes acontece que “por trás das aparências de religiosidade e até de amor à Igreja”, na verdade, buscamos «a glória humana e o bem-estar pessoal»”, disse Francisco, ressaltando que “é muito triste quando se encontra sacerdotes que são funcionários, que se esqueceram de ser pastores do povo e se tornaram clérigos de Estado. É ruim quando se perde o sentido sacerdotal”.
O seminário é o tempo de ser verdadeiros com nós mesmos, deixando cair as máscaras, artimanhas e aparências. Neste processo de discernimento, deixem que o Senhor trabalhe em vocês, que os fará pastores segundo o seu coração porque o contrário é usar máscara, maquiar-se, aparecer é coisa de funcionários, não de pastores do povo, mas de clérigos de Estado.
A seguir, Francisco fez a mesma pergunta de Jesus aos bispos: “O que vocês estão procurando? O que desejam para o futuro da sua terra, com que Igreja vocês sonham? Que tipo de padre vocês imaginam para o seu povo? Vocês são responsáveis pela formação desses jovens.”
Este discernimento é mais necessário hoje do que nunca, porque no tempo em que um certo cristianismo do passado se desvaneceu, abriu-se diante de nós um novo tempo eclesial, que exigiu e ainda exige uma reflexão também sobre a figura e o ministério do sacerdote. Não podemos mais pensá-lo como um pastor solitário, fechado no recinto paroquial; é preciso unir forças e partilhar ideias, para enfrentar alguns desafios pastorais que já são transversais a todas as Igrejas diocesanas de uma Região. Penso na evangelização dos jovens, nos percursos de iniciação cristã, na piedade popular, que necessita de escolhas unitárias inspiradas no Evangelho. Penso também nas exigências da caridade e na promoção da cultura da legalidade.
“Tudo isso convida a formar sacerdotes que, vindos de seus próprios contextos, saibam cultivar uma visão comum do território e tenham uma formação humana, espiritual e teológica unitária”, sublinhou o Papa, pedindo-lhes para “canalizar todas as energias humanas, espirituais e teológicas num único Seminário“. “Não se trata de uma escolha logística ou meramente numérica, mas destinada a amadurecer juntos uma visão eclesial e um horizonte de vida sacerdotal, em vez de dispersar forças multiplicando os lugares de formação e mantendo pequenas realidades com apenas alguns seminaristas”.
Segundo o Papa, “um seminário com 4, 5, 10 pessoas não é seminário, não se forma seminaristas; um seminário com 100, anônimo, não forma seminaristas. São necessárias pequenas comunidades também dentro de um grande seminário ou um seminário com medida humana que seja o reflexo do colégio presbiteral. É um discernimento que não é fácil fazer, não é fácil. Mas tem que ser feito e decisões têm que ser tomadas sobre isso. Não será Roma que vai lhes dizer o que fazer, não: porque vocês têm o carisma. Nós damos ideias, orientações, conselhos, mas vocês têm o carisma, vocês têm o Espírito Santo para isso. Se Roma começasse a tomar decisões, seria uma bofetada no Espírito Santo, que age nas Igrejas particulares.
Segundo o Papa, “este processo está sendo iniciado em muitas partes do mundo e é natural que haja alguma resistência e algum esforço em dar este passo”. “Mas recordemos que o apego à nossa história e aos lugares significativos da nossa tradição não deve impedir a novidade do Espírito de traçar caminhos a seguir, sobretudo quando o caminho da Igreja o exige. O Senhor nos pede uma atitude de vigilância, para que não nos aconteça “como nos dias de Noé”, quando as pessoas, preocupadas com as coisas habituais, não notaram que chegava o dilúvio. Precisamos de olhos abertos e coração atento para captar os sinais dos tempos e olhar adiante”, concluiu Francisco.
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