Andressa Collet – Vatican News
O Papa Francisco recebeu nesta quinta-feira (23) cerca de 300 pessoas na Sala Clementina, no Vaticano, que participaram durante dois dias da Conferência “Santo Afonso, pastor dos últimos e doutor da Igreja”, promovida pela Pontifícia Academia Afonsiana, de Roma. A instituição com 74 anos de fundação, especializada em teologia moral dentro da Pontifícia Universidade Lateranense, promoveu o encontro em modalidade virtual a partir da Aula Magna para aprofundar três temas centrais: a consciência (moral fundamental), a justiça social (moral social) e a pessoa (bioética). A reflexão, entre desafios e perspectivas, foi feita por professores locais e de outras realidades acadêmicas da Itália e também do exterior.
No discurso do Papa, de encerramento da conferência, o Pontífice começou agradecendo pelo “serviço de formação” oferecido pela Academia à Igreja no âmbito da teologia moral, inclusive o trabalho de professores eméritos e ex-estudantes. Refletindo sobre a consciência e o dinamismo da formação, toda proposta teológico-moral, disse Francisco, “deve ajudar os fiéis a compreender a grandeza de levar a caridade de Cristo ao mundo” (cf. Decr. Optatam totius, 16), “o amor de Deus” que guia as escolhas de cada um. Por isso a importância de “entrar em uma relação viva com o Povo de Deus”, especialmente com os últimos, dando respostas às dificuldades reais através da luz de Cristo e não de uma abordagem “moral fria de escrivaninha”:
“Fiéis à tradição afonsiana, vocês procuram oferecer uma proposta de vida cristã que, respeitando as exigências da reflexão teológica, não seja uma moral fria, uma moral de escrivaninha, eu diria uma moral “casuística” e digo isso sabendo porque, infelizmente, estudei uma moralidade ‘casuística’ naquela época. Imaginem que não podíamos, era proibido ler o primeiro livro de Häring, ‘A Lei de Cristo’: ‘Não! É herético, não se pode ler!’ E eu só estudei com aquela moralidade: ‘Pecado mortal se faltam duas velas na mesa, venial se falta apenas uma’… E toda a casuística assim e digo isso humildemente… Graças a Deus que aquilo é passado, era uma moral fria de escrivaninha. O que se exige de vocês é uma proposta que responda a um discernimento pastoral carregado de amor misericordioso, visando compreender, perdoar, acompanhar e sobretudo integrar (cf. Exortação Apostólica pós-sinodal Amoris laetitia, 312). Ser eclesial pressupõe isto: integrar.”
Sobre o campo “complexo” da bioética, Francisco convidou a exercer a paciência da escuta, a não ter medo diante de situações de conflito, a adotar métodos de pesquisa transdisciplinar que permitam “abordar novos desafios com maior competência e capacidade crítica, à luz do Evangelho e da experiência humana (cf. Gaudium et spes, 46)”. O Papa também exortou a se “afastar de dinâmicas extremistas de polarização, mais típicas do debate mediático do que da pesquisa científica e teológica saudável e fértil”, e, sobretudo, recomendou a “tornar acessível” e com uma “linguagem do povo” o trabalho realizado pelos profissionais da área:
O Papa, depois, refletiu sobre o terceiro tema da conferência da Academia Afonsiana, isto é, as questões de moralidade social pertinentes à crise ambiental, à transição ecológica, à guerra, ao sistema financeiro, à construção de fraternidade entre os povos, e mais atualmente, à migração e à pedofilia, para estimular a pesquisa e o diálogo. A Igreja espera, concluiu Francisco, que a Pontifícia consiga “conciliar rigor científico e proximidade ao santo povo fiel de Deus”, dando “respostas concretas aos problemas reais”, atentas “à Verdade salvadora e ao bem das pessoas”. Assim como fez Santo Afonso de Liguori, “um grande teólogo”, mas capaz de compor canções natalinas confirmando “a beleza da alma”, sendo formadores de consciências e maestros de esperança:
“Procuremos então entrar com humildade e sabedoria no complexo tecido da sociedade em que vivemos, a fim de conhecer bem sua dinâmica e propor aos homens e mulheres de nosso tempo caminhos adequados de maturação nessa direção (cf. Gaudium et spes, 26). E eu falo de caminhos, caminhos adequados, não de soluções matemáticas. Os problemas se resolvem caminhando eclesialmente como povo de Deus. E caminhar com as pessoas no estado moral em que se encontram. Carminhar com eles e procurar uma maneira de resolver seus problemas, mas caminhando, não ficar sentados como doutores que, com o dedo assim, condenam sem se importarem.”
Mariangela Jaguraba – Vatican News
O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta quinta-feira (23/03), na Sala Paulo VI, no Vaticano, cerca de quinhentos participantes do 33° Curso sobre o Foro Interno promovido pela Penitenciaria Apostólica.
Em seu discurso, o Pontífice recordou que “há mais de três décadas, a Penitenciaria Apostólica oferece este importante e valioso momento de formação, para contribuir na preparação de bons confessores, plenamente conscientes da importância do ministério a serviço dos penitentes”. O Papa os encorajou “a prosseguir neste compromisso formativo, que tanto bem faz à Igreja, pois ajuda a circular em suas veias a seiva da misericórdia”.
Existe, portanto, um vínculo inseparável entre a vocação missionária da Igreja e a oferta de misericórdia a todos os homens. Vivendo da misericórdia e oferecendo-a a todos, a Igreja se realiza e cumpre sua ação apostólica e missionária. Quase poderíamos dizer que a misericórdia está incluída nas “notas” características da Igreja, em particular faz resplandecer a santidade e a apostolicidade.
“Desde sempre, a Igreja, com estilos diferentes nas várias épocas, expressou esta “identidade de misericórdia”, dirigida tanto ao corpo quanto à alma, desejando, com seu Senhor, a salvação integral da pessoa. A obra da misericórdia divina coincide assim com a própria ação missionária da Igreja, com a evangelização, porque nela resplandece o rosto de Deus como Jesus nos mostrou”, sublinhou Francisco.
Segundo o Papa, “não é possível, sobretudo neste tempo da Quaresma, deixar de dar atenção ao exercício da caridade pastoral, que se expressa de modo concreto e eminente na plena disponibilidade dos sacerdotes ao exercício do ministério da reconciliação”.
A seguir, Francisco convidou “a pensar em Jesus, que escolhe ficar em silêncio diante da mulher adúltera, para salvá-la da condenação à morte”.
Assim também o sacerdote no confessionário deve amar o silêncio, ser magnânimo de coração, sabendo que cada penitente o recorda a sua própria condição pessoal: ser pecador e ministro da misericórdia. Esta consciência fará com que os confessionários não fiquem abandonados e que não falte a disponibilidade dos sacerdotes. A missão evangelizadora da Igreja passa em grande parte pela redescoberta do dom da Confissão, também em vista do iminente Jubileu de 2025.
Segundo o Papa, “nos planos pastorais das Igrejas particulares, nunca deve faltar espaço para o serviço da Reconciliação sacramental”. “Se a misericórdia é a missão da Igreja, devemos facilitar ao máximo o acesso dos fiéis a este “encontro de amor”, cuidando dele desde a primeira Confissão das crianças e estendendo esta atenção aos lugares de cuidado e sofrimento”, sublinhou.
Quando já não se pode fazer muito para curar o corpo, muito se pode e deve sempre ser feito para a saúde da alma! Neste sentido, a Confissão individual é o caminho privilegiado a percorrer, porque favorece o encontro pessoal com a Divina Misericórdia, que todo coração arrependido espera. Na Confissão individual, Deus quer acariciar pessoalmente, com a sua misericórdia, cada pecador: o Pastor, só Ele, conhece e ama as ovelhas uma por uma, especialmente as mais frágeis e feridas. As celebrações comunitárias devem ser valorizadas em algumas ocasiões, sem renunciar às Confissões individuais como forma ordinária de celebrar o sacramento.
“No mundo, infelizmente vemos isso todos os dias, não faltam focos de ódio e vingança. Nós, confessores, devemos então multiplicar os “focos da misericórdia”, sublinhou o Papa.
A seguir, Francisco disse que “Jesus nos ensinou que nunca devemos dialogar com o diabo: nunca! À tentação no deserto Ele respondeu com a Palavra de Deus, mas não entrou em diálogo”.
Cuidado no confessionário: nunca dialogar com o mal, nunca! Dar o perdão e abrir alguma porta para que a pessoa possa ir adiante; mas não ser um psiquiatra, por favor, um psicanalista: não, nunca entrar nessas coisas. Se alguém de vocês tem esta vocação, deve exercê-la em outro lugar, não no tribunal da penitência. Este é um diálogo que não cabe a um momento de misericórdia.
O Papa concluiu, dizendo que acompanha a Penitenciaria Apostólica na oração, e agradeceu ao organismo “pelo trabalho que realiza incansavelmente em favor do Sacramento do Perdão”.
Vatican News