Quaresma é tempo de conversão, não de tristeza; tempo de revisão de vida, de voltar-se para o Senhor enquanto Ele se deixa encontrar; é tempo de caminhar, tempo de aprender a contar os nossos dias, pois, como canta o salmista, a nossa vida é “igual à erva verde pelos campos, que de manhã ela floresce vicejante, mas à tarde é cortada e logo seca” (Sl 89,6). Quaresma é o tempo oportuno de renovar o compromisso com a santidade, que é o chamado universal de todo o cristão.
Todos os anos, após as festividades cívicas do carnaval, que tem a sua data pré-fixada depois da escolha do Tríduo Pascal, cuja origem situa-se no calendário lunar hebraico, a Igreja nos convida, através da Liturgia Eucarística, a adentrar mais profundamente no mistério pascal de Cristo, dentro do tempo litúrgico da Quaresma. Tal mistério nos introduz no cerne da fé cristã: a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus.
Aprender com a Igreja o caminho de perfeição
Neste tempo propício para a conversão, a Igreja, como mãe, ensina-nos a buscar com maior empenho, no nosso dia a dia, a vivência das práticas de piedade cristã, tais como a Oração, o Jejum e a Esmola, como também a trilhar um caminho de perfeição por meio das virtudes cristãs da Fé, Esperança e Caridade.
Mas, diante de tal proposta, uma pergunta se faz pertinente: como posso trilhar um caminho de conversão pessoal que seja sincero e que produza frutos em minha vida e na sociedade, estando privado do contato pessoal e presencial com a Igreja, templo físico e pessoal? Como viver a Oração, o Jejum e a Esmola sem o contato com o meu próximo, a quem se dirige, direta ou indiretamente as minhas ações quaresmais? Como escolher caminhos que me levem a viver bem este tempo que me é favorável para a conversão e que me façam crescer na intimidade com Deus e na busca da santidade?
A essa indagação, a liturgia da Quarta-Feira de Cinzas indica-nos um caminho seguro e eficaz a seguir, e nos aponta para aquilo que somos e o nosso destino último, e por essa razão também nos dá a resposta de como deve ser o nosso proceder neste mundo. Diz o livro Gênesis 3,9: “Lembra-te que és pó e que ao pó hás de voltar”. Sim, somos pó e ao pó voltaremos. Seja você rico ou pobre, são ou enfermo, alto ou baixo, branco ou negro, independentemente daquilo que você é, de uma realidade você não escapará: ao pó hás de voltar.
A fecundidade do tempo quaresmal perpassa o reconhecimento da própria finitude
A nossa existência neste mundo não passa de um brevíssimo segundo, um pequeno instante diante da eternidade que se abrirá aos nossos olhos no dia em que o Senhor, em sua misericórdia, chamar-nos a estar com Ele face a face. De fato, a vida humana é um breve instante, e a morte é apenas uma janela que se abre a nós para contemplarmos o Eterno que veio no tempo morar.
Quaresma é o tempo de aprender a viver bem para morrer bem. Viver o tempo da Quaresma sem ter diante dos olhos o horizonte da finitude humana, que é inerente à vontade do Homem, faz deste tempo pouco proveitoso e nada fecundo, pois, na reflexão da própria vida e na conversão pessoal que é assumida neste tempo litúrgico, encontra-se a centralidade do tempo quaresmal.
Papa Francisco diz: “A Quaresma é um tempo propício para o despojamento; e far-nos-á bem questionar-nos acerca do que nos podemos privar a fim de ajudar e enriquecer a outros com a nossa pobreza”. São Francisco de Sales diz ainda: “A Quaresma é o outono da vida espiritual, durante o qual colhemos os frutos para todo o ano”. Bento XVI, por sua vez, diz que “através das práticas tradicionais do jejum, da esmola e da oração, expressões do empenho de conversão, a Quaresma educa para viver de modo cada vez mais radical o amor de Cristo”.
Despojamento de si e oferta ao próximo
Enfim, seja pelas práticas quaresmais ou pela busca das virtudes teologais, uma coisa é certa: para viver bem o tempo quaresmal é preciso, antes de mais nada, reconhecer-se necessitado da graça de Deus que supera todo o entendimento. Depois, não há vivência quaresmal no egoísmo do próprio eu, de uma vida indiferente e alheia às necessidades dos irmãos. Santo Antônio diz que, na Quaresma, “deve-se dar a esmola ao pobre não só com a mão, mas com o afeto do coração, para que a avareza não fique a chorar a esmola”, pois o Deus que nos consola em todas as nossas aflições e tribulações espera que também nós assim o façamos para com todos aqueles que se acham aflitos e atribulados (Cf. 2Cor. 1,4).
Agora, podemos nos perguntar de novo: como posso trilhar um caminho de conversão pessoal que seja sincero e que produza frutos em minha vida e na sociedade, estando privado do contato pessoal e presencial com a Igreja, templo físico e pessoal? Como viver a Oração, o Jejum e a Esmola sem o contato com o meu próximo, a quem se dirige, direta ou indiretamente as minhas ações quaresmais? Como escolher caminhos que me levem a viver bem este tempo que me é favorável para a conversão e que me façam crescer na intimidade com Deus e na busca da santidade?
Vivendo essa Quaresma como diz Francisco de Sales: “como se fosse a última e tiraremos um bom proveito”.
Deus abençoe você e os seus bons propósitos quaresmais!
Lucas Paulino, missionário da Comunidade Canção Nova
Canção Nova