«O que é o homem para dele te lembrares?». “Vieram-me à mente estas palavras, pensando em vocês (…). recordação é uma palavra-chave para a vida.”
O versículo 5 do Salmo 8 foi o ponto de partida da homilia do Papa Francisco na Missa celebrada na Praça Cavour em Camerino, região das Marcas atingida pelos terremotos de 2016:
“Diante do que vocês viram e sofreram, diante de casas desabadas e de prédios reduzidos a escombros, vem esta pergunta: o que é o homem? O que é, se aquilo que constrói pode ruir em um instante? O que é, se a sua esperança pode acabar em pó? O que é homem?” .
A resposta – acrescenta o Papa – parece vir da continuação da frase: “o que é o homem para dele te lembrares? De nós, assim como somos, com nossas fragilidades, Deus recorda-se. Na incerteza que sentimos por fora e por dentro, o Senhor nos dá uma certeza: Ele recorda-se de nós. “Re-corda”, isto é, retorna, retorna com seu coração a nós, porque estamos em seu coração. E enquanto aqui embaixo muitas coisas são rapidamente esquecidas, Deus não nos deixa no esquecimento. Ninguém é desprezível aos seus olhos, cada um tem um valor infinito para ele: somos pequenos sob o céu e impotentes quando a terra treme, mas para Deus somos mais preciosos que qualquer coisa”.
Francisco enfatiza a importância de “recordar” de que “não somos esquecidos por Deus, que somos seus filhos amados, únicos e insubstituíveis.” E recordar d’Ele, “nos dá força para não nos rendermos diante das contrariedades da vida”:
“Recordamos o quanto valemos, diante da tentação de nos entristecer e de continuar a desenterrar aquele pior que parece nunca acabar. As más recordações chegam, mesmo quando não pensamos nelas; mas pagam mal: deixam somente melancolia e nostalgia. Mas quão difícil é libertar-se das más recordações! Vale aquele ditado, segundo o qual foi mais fácil para Deus tirar Israel do Egito do que o Egito do coração de Israel”.
E para conseguirmos nos libertar “do passado que retorna, das recordações negativas que nos fazem prisioneiros, dos arrependimentos que paralisam”, temos necessidade de alguém que nos ajude a carregar os pesos que temos dentro, diz o Papa.
Jesus não nos tira os pesos como gostaríamos, pois “estamos sempre em busca de soluções rápidas e superficiais”, mas Ele “nos dá o Espírito Santo (…), o Consolador, Aquele que não nos deixa sozinhos sob os pesos da vida”:
“É Ele que transforma nossa memória escrava em memória livre, as feridas do passado em recordações de salvação. Ele realiza em nós o que fez por Jesus: as suas chagas, aquelas feridas feias escavadas pelo mal, pelo poder do Espírito Santo, tornaram-se canais de misericórdia, chagas luminosas nas quais resplandece o amor de Deus, um amor que eleva, que faz ressurgir. É isso que o Espírito Santo faz quando o convidamos para as nossas feridas. Ele unge as más recordações com o bálsamo da esperança, porque o Espírito Santo é o reconstrutor da esperança.”
Mas, temos necessidade de uma esperança que não desiluda. As esperanças terrenas são efêmeras – afirma o Pontífice – têm sempre “data de vencimento”, pois “são feitas de ingredientes terrenos, que cedo ou tarde estragam”, ao contrário da esperança do Espírito:
“A do Espírito é uma esperança duradoura. Não expira, porque se baseia na fidelidade de Deus. A esperança do Espírito tampouco é otimismo. Nasce no mais profundo, reacende no fundo do coração a certeza de sermos preciosos porque amados. Infunde a confiança de não estarmos sozinhos. É uma esperança que deixa a paz e a alegria por dentro, independentemente do que aconteça fora. É uma esperança que tem raízes fortes, que nenhuma tempestade da vida pode desenraizar.”
Se por um lado – observa Francisco – quando estamos perturbados ou feridos, somos levados a “fazer o ninho” em torno às nossas tristezas e nossos medos, por outro “o Espírito liberta-nos de nossos ninhos, nos faz levantar voo, nos desvela um destino maravilhoso destino para o qual nascemos.
A terceira e última palavra que o Papa quis compartilhar com os fiéis foi “proximidade”. Para tal, recordou a Santíssima Trindade, que “é um mistério da proximidade de Deus”.
“A Trindade nos diz que não temos um Deus solitário lá no alto, no céu, distante e indiferente. Não! É Pai que nos deu o seu Filho, feito homem como nós, e que para estar mais próximo ainda, para nos ajudar a carregar os pesos da vida, nos envia seu próprio Espírito. Ele, que é Espírito, vem em nosso espírito e assim nos consola por dentro, leva a ternura de Deus ao nosso interior”:
“Com Deus, os fardos da vida não permanecem em nossos ombros: o Espírito, a quem nomeamos toda vez que fazemos o sinal da Cruz, precisamente quando tocamos nossos ombros, vem nos dar força, encorajar-nos, sustentar nossos fardos. De fato, ele é especialista em ressuscitar, em elevar, em reconstruir. É preciso mais força para reparar do que para construir, para recomeçar do que para iniciar, para reconciliar-se do que para concordar. Essa é a força que Deus nos dá. Por isso, quem se aproxima de Deus não se abate, mas segue em frente: recomeça, tenta de novo, reconstrói.”
“Queridos irmãos e irmãs – disse o Santo Padre, encaminhando-se para o final de sua homilia – eu vim hoje para estar próximo de vocês. Estou aqui para rezar com vocês a Deus que se recorda de nós, para que ninguém se esqueça de quem está em dificuldades. Rezo ao Deus da esperança, para que aquilo que é instável na terra não abale a certeza que temos dentro. Rezo ao Deus Próximo, para que suscite gestos concretos de proximidade. Quase três anos se passaram e o risco é que, após o primeiro envolvimento emocional e midiático, a atenção caia e as promessas acabem em segundo plano, aumentando a frustração daqueles que veem o território cada vez mais despovoado. O Senhor, ao contrário, impele a recordar, reparar, reconstruir e a fazer isso juntos, sem nunca esquecer aqueles que sofrem.”
“O que é o homem para dele te lembrares? Deus que se lembra de nós, Deus que cura nossas memórias feridas ungindo-as de esperança, Deus que está perto de nós para nos reerguer por dentro, nos ajude a sermos construtores de bem, consoladores de corações”, disse Francisco ao concluir.
Radio Vaticano
“Esta é a motivação, a força de toda a nossa vida religiosa, e também de nossa ação com os jovens: levá-los a Deus”.
Ao receber na manhã deste sábado, 15, na Sala Clementina os cerca de 70 participantes do Capítulo Geral da Ordem da Santíssima Trindade e dos Escravos Trinitários, o Papa falou sobre os desafios da pastoral juvenil e vocacional, “um tema vital para a Igreja (…) e certamente também de grande importância para a vossa Ordem”.
Francisco começou seu discurso agradecendo ao novo Superior Geral, padre Luigi Buccarello, e às tantas obras de misericórdia desenvolvidas pela Ordem nas escolas, paróquias, prisões, institutos de reabilitação, chamando a atenção, de que o trabalho vocacional, qualquer que seja, “não é proselitismo.”
No Instrumentum Laboris do Capítulo é reconhecida “a dificuldade de linguagem e de método para comunicar com o mundo juvenil” e mesmo a “necessidade de uma formação específica para a pastoral de acompanhamento e de discernimento”.
Somado a isso, diante de “uma cultura de grande vazio provocada por um pensamento frágil e pelo relativismo (…), da cultura fragmentada onde os grandes temas perderam o significado”, poder-se-ia pensar que “não há espaço para uma proposta vocacional de fé às novas gerações. Mas tirar esta conclusão, seria um grave erro”, adverte Francisco.
Também hoje – recorda o Papa – “há jovens que ardentemente buscam o pleno significado de suas vidas; jovens que são capazes de dedicação incondicional às grandes causas; jovens que apaixonadamente amam Jesus e demonstram grande compaixão pela humanidade”.
“Felicidade, amor, sucesso, realização pessoal”, fazem parte do mundo das aspirações de nossos jovens, “que precisam ser ordenadas, como o Criador fez no princípio dos tempos, passando do caos à ordem do cosmo”, e é justamente aqui que vocês “podem e devem entrar (…), para ajudar os jovens a harmonizarem suas aspirações e colocá-las em ordem”, sem esquecer que os jovens pedem que seja dado a eles um certo protagonismo. Eles “devem ser protagonistas, esta é a chave, e protagonistas em movimentos, não quietos”, reiterou o Papa.
E para chegar a eles, é preciso uma criatividade “que parta da conversão pastoral a que nós somos chamados, para poder chegar a eles e fazer uma proposta evangélica que os ajude a discernir a vocação para a qual são chamados na Igreja”.
O Papa então, indica alguns desafios apresentados pela pastoral juvenil e vocacional, a começar pela “proximidade e acompanhamento”.
Os jovens nos querem próximos, enfatiza Francisco. A pastoral juvenil e vocacional exige acompanhamento, o que comporta proximidade, estar presente na vida dos jovens. “Os jovens vos querem como companheiros de caminho”:
“A proximidade é a única coisa que pode garantir uma relação fecunda – evangelicamente falando – com os jovens. Abram as vossas casas e comunidades aos jovens, para que possam compartilhar a vossa oração e a vossa fraternidade, mas sobretudo abram os vossos corações a eles. Que eles se sintam amados pelo que são, por como são. Sejam para os jovens irmãos mais velhos com quem eles possam conversar, em quem eles possam confiar. Escutem-nos, conversem com eles, façam discernimento juntos. Isso cansa! E esse é o preço: o vosso cansaço.”
O segundo ponto indicado por Francisco é “em saída”, isto é, “há necessidade de ir de encontro aos jovens e não somente aos próximos”, mas “ir de encontro àqueles que estão distantes. Acolhê-los como são. Nunca desprezar seus limites. Apoiá-los e ajudá-los até onde isto for possível”:
“Encorajo-vos a caminhar com eles, saindo de esquemas pré-fabricados – por favor, pastorais pré-fabricadas não, não dá certo! -, sem esquecer que, especialmente com os jovens, é preciso ser perseverantes, semear e esperar pacientemente que a semente cresça e um dia, quando o Senhor quiser, dê frutos. Vosso trabalho é semear, Deus fará crescer e talvez outros colherão os frutos. Que vossa pastoral juvenil seja dinâmica, participativa, alegre, cheia de esperança, capaz de correr riscos, confiante. E sempre cheia de Deus, que é o que os jovens mais precisam para preencher seu anseio por plenitude. Uma pastoral cheia de Jesus, que é o único caminho que os leva ao Pai, a única verdade que sacia sua sede, a única Via pela qual vale a pena deixar tudo.”
E toda esta dedicação, “para que sejam santos”, o terceiro ponto.
“Esta é a motivação de toda nossa vida religiosa, e também de nossa ação com os jovens, levá-los a Deus”. Diante da tentação de resignação, vos é pedida a “audácia evangélica para lançar as redes, mesmo que possa parecer não ser o tempo e o momento mais oportuno”:
“Diante de uma vida sonolenta, adormentada e cansada, vos é solicitado para ficarem despertos, para poder despertar; vos é pedido para serem profetas da esperança e da novidade, profetas da alegria com a vossa própria vida, sabendo que a melhor pastoral juvenil e vocacional é viver a alegria da sua própria vocação.”
“Deus chama em todos os lugares, Deus não faz preferência de pessoas, chama a todos. Sejam corajosos! (…) Vençamos nossos medos! Levantemo-nos! Os jovens, próximos e distantes, nos esperam”, disse o Papa ao concluir, pedindo para não esquecerem de rezar por ele.
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