O perdão é um remédio. Na hora, pode ser amargo, mas faz bem, alivia o mal-estar interior

O perdão é uma graça que Deus nos dá para prosseguirmos no caminho após um ferimento profundo. O perdão age como uma cauterização, curando de dentro para fora. Sim, a cicatriz permanece, pois as lembranças são a garantia de que temos uma história. E a palavra “cura” aplica-se perfeitamente neste caso, visto que, por algum motivo, houve uma ferida, e o perdão sobre essa ferida evita, metaforicamente, infecção e até necrose.

A falta de perdão pode virar uma doença real e levar à morte, se não a física, à morte espiritual, psíquica e moral. A falta de perdão mata sonhos, projetos, perspectivas etc. Além disso, muitas são as doenças psicossomáticas causadas pela falta de perdão: depressão, ansiedade, pânico, câncer e doenças cardíacas, estão relacionados à falta de perdão (1). (2).

Jesus nos deixa um antídoto: “Não se ponha o sol sobre o vosso ressentimento” (Ef 4,26). Aqui, aplica-se tanto no externo (perdão para com o outro) como internamente (perdão para consigo mesmo).

Às vezes, a falta de perdão é de nós para nós mesmos. Culpamo-nos por tantas coisas, guardamos mágoa, tristeza, ressentimento, revoltas, medos de nós mesmos, mas nos esquecemos de nos perdoar.

Fora isso, protelamos as conversas de reconciliação, os pedidos de perdão aos que amamos ou vivem mais próximos de nós. Esse protelar, essa demora, vai azedando as relações, abrindo espaço para a mente criar e projetar situações irreais. Por isso, ter pressa para reconciliar-se é importante. Claro que não se deve atropelar nada, é preciso dar tempo para si mesmo, entender os sentimentos e até as reações diante de uma situação que exija reconciliação. Contudo, não mais que tempo suficiente para rezar e buscar o momento da reconciliação, caso contrário, corremos o risco de desistir da reconciliação e optar por um “deixa pra lá”, e acabar por não resolver a situação.

O perdão é chave, remédio e dom

Pensando no perdão ainda, podemos dizer:

Perdão é chave que abre e fecha as portas das relações, dos sentimentos, a porta da confiança e da esperança.

Perdão é remédio. Na hora pode ser amargo, mas faz bem, alivia o mal-estar interior, traz alívio para alma.

Perdão é degrau que nos eleva, aproxima-nos do Cristo que tomou sobre si nossas culpas, mas também nos perdoou dos nossos pecados.

Perdão é dom, é presente que vem com recomendação: não reter. Jesus explica com clareza: “70 vezes 7” é o número das vezes que devemos perdoar a cada dia (cf. Mt 18,22). Eu bem creio que essa seja a média de vezes que Ele nos perdoa a cada dia, e por isso nos orienta.

Perdão é medida, revela o quão raso ou o quão profundo podemos ser, e aqui nos lembramos também do Evangelho de Mt 7,2b: “Com a mesma medida que medirdes vós sereis medidos.”

Aqui se vai a lista com que podemos comparar o perdão. Mas quero dar espaço para que, neste momento de oração, o Senhor mesmo vá trazendo ao seu coração as comparações que lhe sejam mais úteis.

Peçamos ao Senhor, que é rico em misericórdia e quis Ele primeiro nos dar o seu perdão, que nos ensine a perdoar, a sermos como Ele: “Lentos para a cólera e rápidos para a misericórdia” (Sl 103,8-9).

Oração

Senhor, nós Te pedimos que, à medida que formos percebendo em nós a necessidade de perdão, que se dilate também o desejo e a decisão de perdoar. Que, diante das situações mal resolvidas, a Tua luz tenha o poder de afugentar as trevas e nos conceder a força de buscar as resoluções necessárias: dar e receber perdão, rever a situação e rever-se diante dela, reconciliar, retomar, recomeçar. Senhor, que o “degrau” do perdão nos faça, de forma concreta, abraçar a Tua cruz.

Senhor, eu Te peço que, nesta oportunidade que agora se revela, eu possa fazer essa experiência profunda de perdoar a mim mesmo, de recordando-me dos que me causaram alguma dor, ofensa ou mal, e eu os possa perdoar e amar. Também Te peço, Senhor, perdoa-me! Dá-me a coragem de buscar e dar o perdão. Que eu não o retenha. Amém.

Carla Picolotto
Missionária da Comunidade Canção Nova

Canção Nova

Não devemos nos aproximar do diabo nem dialogar com ele: é “um derrotado”, mas perigoso porque seduz e, como um cão raivoso encoleirado, morde se é acariciado. Esta é a advertência do Papa Francisco na homilia da Missa na Casa Santa Marta.

Toda a sua reflexão foi inspirada na figura do diabo que não morreu, mas “já foi condenado”, como diz o Evangelho da Liturgia do dia extraído de João (Jo 16,5-11). “Podemos dizer que é moribundo”- disse o Papa –, mas é em todo caso um “derrotado”.
Porém, não é fácil nos convencer, porque “o diabo é um sedutor”, “sabe quais palavras usar”, e “nós gostamos de ser seduzidos”, explicou Francisco:

E ele tem esta capacidade; esta capacidade de seduzir. Por isso é muito difícil entender que é um derrotado, porque ele se apresenta com grande poder, promete tantas coisas, traz presentes – bonitos, bem embrulhados– “Oh, que lindo!” – mas você não sabe o que tem dentro – “Mas o papel fora é bonito”. Ele nos seduz com o embrulho sem nos mostrar o que tem dentro. Sabe apresentar as suas propostas para a nossa vaidade, a nossa curiosidade.

Mentiroso

Os caçadores, de fato, dizem para não se aproximar do crocodilo que está para morrer porque com a cauda ele inda pode matar. “É perigosíssimo”: apresenta-se com todo o seu poder, “as suas propostas são mentiras” e “nós, tolos, acreditamos”.

O diabo, de fato, “é um grande mentiroso, o pai da mentira”. “Sabe falar bem”, “é capaz de cantar para enganar”: “é um derrotado, mas se move como um vencedor”. A sua luz é radiante “como fogos de artifício”, mas não dura, desaparece, enquanto a luz do Senhor é “tênue, mas permanente”.

Sedutor

O diabo – reiterou Francisco – “nos seduz, sabe tocar a nossa vaidade, a curiosidade e nós compramos tudo”, isto é, “caímos na tentação”. Portanto, é “um derrotado perigoso”. “Devemos estar atentos ao diabo”, exorta então o Papa, convidando, como diz Jesus, a vigiar, rezar e jejuar. Assim se vence a tentação. Depois, é fundamental “não se aproximar dele” porque, como dizia um Pai da Igreja, é como um cão “bravo”, “raivoso”, preso na corrente, mas que não se deve acariciar porque morde:

Se eu sei que espiritualmente me aproximando daquele pensamento, daquele desejo, se vou daquele lado ou de outro, estou me aproximando do cão nervoso e encoleirado. Por favor, não faça. “Tenho uma grande ferida…” – “Quem fez isso?” – “O cão” – “Mas ele estava preso?” – “Eh, sim, aproximei-me para lhe fazer um carinho” – “Então você procurou”. É assim: jamais se aproximar, porque está preso. Deixe-o preso ali.

Recorrer à mãe

Por fim, devemos estar atentos a não dialogar com o diabo como fez, ao invés, Eva: “ela acreditou ser a grande teóloga e caiu”. Jesus não o faz: no deserto, responde com a Palavra de Deus. Expulsa os demônios, algumas vezes pergunta o nome, mas não dialoga com eles. A exortação do Papa, portanto, é muito clara: “Com o diabo não se dialoga, porque ele nos vence, é mais inteligente do que nós”. Ele se fantasia de anjo da luz, mas é “um anjo de sombra, um anjo de morte”:

É um condenado, é um derrotado, é um encoleirado que está para morrer, mas é capaz de fazer estragos. E nós devemos rezar, fazer penitência, não nos aproximar, não dialogar com ele. E no final, procurar a mãe, como as crianças. Quando as crianças têm medo, procuram a mãe: “Mãe, mãe… estou com medo!”, quando sonham… procuram a mãe. Procurar Nossa Senhora; ela nos protege. E os Pais da Igreja, sobretudo os místicos russos, dizem: nos tempos de turbamentos espirituais, refugiar-se sob o manto da grande Mãe de Deus. Procurar a Mãe. Que Ela nos ajude nesta luta contra o derrotado, contra o cão encoleirado para vencê-lo.

Radio Vaticano

O Papa Francisco enviou uma mensagem de vídeo, nesta segunda-feira (07/05), ao 2º Fórum Internacional sobre as formas modernas de escravidão intitulado “Velhos problemas no novo mundo”, organizado em Buenos Aires, pela arquidiocese ortodoxa, guiada pelo Metropolita Tarasios, e pelo Instituto Ortodoxo “Patriarca Atenágoras” de Berkley, Califórnia, com o patrocínio do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla. O fórum teve início no último sábado (05/05) e prossegue até a próxima terça-feira (08/05).

O objetivo do encontro é reunir profissionais políticos, teólogos e estudiosos provenientes da América Latina e outras regiões, para dar continuidade à conversa iniciada no primeiro fórum, incluindo outras questões como saúde pública, tecnologia e comunidades vulneráveis.

O Papa inicia a mensagem esclarecendo que “a escravidão não é algo de outros tempos – mas tem profundas raízes e se manifesta ainda hoje de várias formas: tráfico de seres humanos, exploração do trabalho por meio de dívidas, exploração de crianças, exploração sexual e trabalho doméstico forçado são algumas das muitas formas. Cada uma delas é mais grave e desumana que a outra”.

Segundo algumas estatísticas recentes, “atualmente existem mais de 40 milhões de pessoas, homens, mas principalmente mulheres e crianças, em situação de escravidão”.

Para o Papa Francisco nossa primeira grande tarefa, “é conhecer o tema, ninguém pode ficar indiferente e, de algum modo, cúmplice desse crime contra a humanidade”.

“Há alguns que, estando diretamente envolvidos em organizações criminosas, não querem que se fale sobre isso, simplesmente porque obtêm altos benefícios graças às novas formas de escravidão.”

“Há também aqueles que, apesar de conhecerem o problema, não querem falar porque estão ali onde termina a “cadeia de consumo”, como consumidores dos “serviços” que oferecem homens, mulheres e crianças que se tornaram escravos. Não podemos nos distrair: todos somos chamados a sair de todas as formas de hipocrisia, enfrentando a realidade. O problema não está nas calçadas diante de nós: o problema nos envolve. Não podemos olhar para outro lado e declarar a nossa ignorância ou nossa inocência.”

Francisco prossegue: “A segunda tarefa é agir em favor dos que se tornaram escravos: defender seus direitos, impedir que os corruptos e os criminosos escapem da justiça e mantenham o controle sobre as pessoas escravizadas”.

Situação Social

Falando da situação social o Papa diz que “não são suficientes políticas de Governos e Organismos Internacionais para o combate da exploração de seres humanos, se as causas não forem enfrentadas”, ou seja, “as raízes mais profundas do problema”.

“Quando os países vivem a pobreza extrema, violência e corrupção, nem a economia, nem o quadro legislativo e nem as infraestruturas de base são eficazes. Não conseguem garantir a segurança, os bens e os direitos essenciais. Deste modo, é mais fácil que os autores desses crimes continuem agindo na impunidade total”.

“Há um dado sociológico: o crime organizado e o tráfico ilegal de seres humanos escolhem as vítimas dentre as pessoas que hoje possuem meios escassos de subsistência e menos esperança pelo futuro”. Elas estão “entre os mais pobres, marginalizados e descartados”.

“A resposta de base é criar oportunidades para um desenvolvimento humano integral, iniciando com a educação de qualidade: este é o ponto chave […] Educação e trabalho”.

O que fazer

Para realizar este imenso trabalho, o Papa convida a todos: “é preciso um esforço comum e global por parte de todos os membros da sociedade”. E prossegue: “a Igreja deve se comprometer nessa tarefa […]. Nós cristãos, todos juntos, somos chamados a desenvolver cada vez mais uma maior colaboração para superar as desigualdades e discriminações”, que é exatamente o que propicia a escravidão.

“Juntos podemos construir uma sociedade renovada e orientada à liberdade, à justiça e à paz”, concliu o Papa na mensagem de vídeo.

Fórum precedente

O fórum precedente realizou-se, em Istambul, na Turquia, nos dias 6 e 7 de fevereiro de 2017, graças à colaboração entre o patriarca ecumênico Bartolomeu I e o arcebispo de Cantuária, Justin Welby, primaz da Comunhão Anglicana.

No final do encontro, centrado no flagelo do tráfico de seres humanos, Bartolomeu e Welby assinaram uma declaração conjunta, expressando o compromisso comum para erradicar todas as formas de escravidão moderna.

Radio Vaticano